Se bem se percebe a bravata, um blogue cheio de marialvas tem que pagar a um pobre desgraçado para dar o corpinho ao manifesto e meter-se com as acções de campanha do PS, habilitando-se a levar uma galheta de um popular mais rijo.
Já não se fazem marialvas como antigamente.
Semana e meia a deixarem-nos brincar ao mundo novo. Versão retro, como todos os bons parques temáticos. Uma mini-festa do Avante, em regime acampamento de verão do Bloco, ambiente urbano - quem ficar com o franchising vai ficar rico. Quando a utopia já estava em ponto-de-rebuçado, acabou-se o recreio. Ao décimo primeiro dia, sintetizemos a revolução: a acampada do Rossio, pela democracia verdadeira, da indignação com a situação política e social do país, a austeridade, a precariedade e o FMI, deliberou... o apoio à Palestina e a condenação da NATO. Regressados da concentração em frente à embaixada de Israel, venha a causa independentista basca, uma festa amizade Portugal-Cuba e está feito. Obrigado pela participação de todos. That's all folks, see you next time.
Arranja-se uma manifestação espontânea para ir perturbar o comício de um adversário político. De preferência, arranjando confusão e desacatos.
Depois, a rapaziada de turno vem reportar o sucesso dos distúrbios, atribuindo-os à campanha adversária.
Os manifestantes espontâneos terem-se descaído que eram apoiantes de Passos Coelho, é um detalhe a corrigir no futuro.
Há dois anos, Manuela Ferreira Leite sugeria que talvez tivesse as suas vantagens suspender a democracia por seis meses. Na campanha eleitoral de 2009, a tese da claustrofobia democrática era um dos pratos fortes - com os resultados que se conhecem. Agora que essa famigerada tese parece ter voltado às campanhas do PSD (o que pode não ser mau prenúncio), o próprio líder dá uma ajuda:
"Não podemos fazer de conta que há democracia".
Era uma das peças que faltava para percebermos melhor porque foi tão pronto a mostrar-se disponível para desenterrar uma questão morta, para aceder a uma nova consulta popular sobre o aborto e para alterar a respectiva lei, apenas 3 anos depois de os portugueses terem expresso a sua vontade numa votação inequívoca em referendo.
O crescimento potencial do CDS, que vai sendo confirmado pelas intenções de voto, preocupa - e muito - o PSD. O ganho que a direita poderia obter com o reforço de dois partidos com votação significativa, paradoxalmente, aumenta (pela transferência de voto para o CDS) a probabilidade de uma derrota a 5 de Junho. É neste contexto de necessidade em ir ao quintal do CDS, que deve ser entendida a ideia de Passos Coelho em trazer para a agenda da campanha a revisão da despenalização da IVG.
Acontece que hoje a larga maioria da sociedade portuguesa, mesmo da que se situa à direita, encontra-se pacificada com o pacto social que foi alcançado e compreende mal a necessidade e a oportunidade de reabrir a frente de batalha. Mais, não só compreende mal como sabe ler-lhe a instrumentalização para caçar votos junto de uma franja ideológica do eleitorado.
Mas pode fazer-se muito pior. Embrulhar a perplexidade que a intenção causa à maioria dos portugueses e a radiografia de uma liderança frágil, sujeita a sucessivas convicções ao sabor do momento, com o papel pardo da cobardia política: nós não estamos a propôr um novo referendo, mas se houver cidadãos que queiram suscitar a questão...
1. Os accionistas devem substituir o administrador da empresa, conta-nos Passos Coelho, fazendo uma analogia com o mundo que conhece. Para além do óbvio - um país é um pouco mais complexo do que uma empresa -, fica o mistério na forma como o conhece: se os políticos são o conselho de administração e os portugueses os accionistas, afinal quem é que trabalha?
2. O PSD prossegue a estratégia tão truculenta quanto desmiolada: o baronato ataca o parceiro natural da direita, os pequenos casos de politiquice suja e rasteira vão sendo atirados à ventoinha, e com apenas 3 dias de campanha, Sócrates já foi comparado a Hitler, Saddam e Drácula. Só faltaria mesmo reabilitar Santana Lopes*.
3. Para não perder de vista o que vai acontecendo pela verdadeira esquerda da esquerda, mais do que ver Louçã vestido de Herói do Ano 2000 ou o sector mural do PCP vandalizar as escadarias da Universidade de Coimbra, convém, de quando em vez, visitar directamente a estufa: o triunfo claro do PP nas municipais espanholas é celebrado pela historiadora Raquel Varela como uma grande derrota da direita. Como? Simples. O PP subiu meio milhão de votos e o PSOE caiu milhão e meio. Como o PSOE não pode ser considerado de esquerda, a direita no seu conjunto perdeu um milhão de votos. Aprendam e pratiquem.
*o que, entretanto, já aconteceu.
1. Fernando Costa, o social-democrata das Caldas, surpreendeu Passos Coelho ao anunciar a sua candidatura à liderança do partido: Para derrotar o Sócrates não era preciso o Pedro, até eu o derrotava.
2. Portas, sempre atento às preocupações que afligem os portugueses, não compreende a estranha obsessão por números redondos: ele é 50 medidas... ele é 30 medidas... ele é 10 ministérios. Realmente, ele há coisas:
3. Começa a ser constrangedor assistir à sucessão de raspanetes do CDS à falta de nível da campanha do PSD.
"Isto é simples. Sócrates precisava de ganhar o debate. Mais do que isso. Precisava de esmagar. Mais do que isso. Era expectável que o fizesse. Não só não ganhou como perdeu"
- Rodrigo Moita de Deus, aqui.
Se as expectativas são muito baixas, uma performance mediana será vista como um retumbante sucesso. Isto é válido para um político como para um sabonete. A história é outra e revela-nos algo muito mais interessante: os apaniguados de Passos Coelho têm mesmo uma expectativa muito baixa sobre o homem que escolheram para candidato a primeiro-ministro.
andré salgado
miguel cabrita
paula mascarenhas
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vitor gaspar; schauble; conversa privada